No Brasil, com o intuito de promover uma melhor distribuição das receitas tributárias, principalmente em favor dos Municípios, a Constituição não previu apenas a possibilidade de instituição de tributos, como também previu um “sistema de repartição de receitas tributárias” dos entes federados “maiores” para os “menores”.
Nesse cenário, o artigo 158, I, da Constituição, afirma que os Municípios devem ficar com montante do Imposto de Renda incidente sobre os rendimentos que pagam. Assim, por exemplo, o imposto de renda retido na folha de pagamento dos Servidores não deve ser repassado à União, ficando com os Municípios.
Ocorre que a União, por intermédio da Receita Federal do Brasil, tem autuado Municípios pelo não pagamento do Imposto de Renda quando há contratação de terceiros prestadores de serviços, bem como quando há o pagamento de aluguéis a particular.
Na visão da União, presente na Instrução Normativa nº 1599/2015, a expressão “pagamento de rendimentos”, prevista no mencionado artigo 158, I, da CF, somente autorizaria aos Municípios ficarem com o Imposto de Renda a partir das retenções em pagamentos feitos aos seus próprios agentes (e não a terceiros contratados para prestar serviços, tampouco nos pagamentos de aluguéis).
O Município de São José do Rio Preto, inclusive, recentemente foi notificado a esclarecer a razão pela qual não recolheu à União o Imposto de Renda sobre as contratações de terceiros e sobre os aluguéis que pagou desde 2016, sobrevindo diligente resposta da Procuradoria no sentido de que tal valor se mostra indevido.
Ora, a interpretação da União é extremamente forçada e retira o artigo 158, I, da CF/88, do seu contexto e objetivo, que é descentralizar as receitas, permitindo harmonia e justiça entre os entes da federação. Ademais, não é equivocado chamar de “rendimento” o que se paga a terceiros contratados pelo Município ou, ainda, o montante pago a título de aluguéis.
Corroborando tal conclusão, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região entendeu recentemente, que o Imposto de Renda retido, mesmo que derivando de pagamentos a terceiros ou pagamentos de aluguéis, pertence aos Municípios. Há pendência de Recurso da União no STF em face dessa decisão.
Considerando que a atuação da União, sobretudo diante do cenário econômico caótico que vivemos em razão da vigente pandemia, é capaz de impactar ainda mais a situação, com reflexos nefastos, inclusive, às camadas mais desfavorecidas da população (já que as pessoas não vivem na União, mas nos Municípios, como diria Francisco Montoro, ex-governador paulista), é certo que o Município está atento e preparado para ir ao Judiciário, a exemplo de outros Municípios, em caso de eventual cobrança indevida do Imposto de Renda que lhe pertence.
Felipe Giacchetto de Queiroz, Procurador do Município de São José do Rio Preto.