Saúde
O que o menino Henry Borel sentiu nos seus últimos momentos de vida?
Artigo escrito pelo Prof. Dr. Edmo Atique Gabriel

Vocês conseguem imaginar o que acontece em nosso corpo quando, por algum mecanismo traumático, ocorrem lacerações do fígado, hemorragia interna e lesão cerebral? No caso do menino Henry Borel, de 4 anos de idade, foram exatamente estes os diagnósticos apontados no laudo do IML do Rio de Janeiro.
Infelizmente, já posso adiantar que este conjunto de lesões foi demasiadamente brutal, impedindo qualquer possibilidade de sobrevida e certamente causando dor, sofrimento e muita tensão nesta criança.
Torna-se fundamental discutir especialmente os aspectos biológicos e clínicos destas lesões, visando demonstrar não somente tudo pelo que Henry passou, como também deixar um alerta acerca do impacto que um acidente ou a violência, seja sob qual formato (doméstica, feminicídio, contra o idoso, contra as crianças), exerce em nosso corpo, nossa alma e nossa estrutura familiar e social.
A primeira informação, de cunho biológico, que merece ser mencionada, é que o volume de sangue total em um corpo humano corresponde a cerca de 7% de seu peso corpóreo. Portanto, uma pessoa adulta de 70 kg armazena em seu corpo aproximadamente 5 litros de sangue. Obviamente, no caso de Henry esta quantidade de sangue é bem menor e sua tolerância a perdas sanguíneas é mais limitada.
Vamos começar comentando sobre o fígado. Trata-se de um órgão insubstituível, de complexidade ímpar, que desempenha incontáveis funções, muitas delas possivelmente ainda desconhecidas pela medicina. É um dos órgãos mais vascularizados do corpo humano. Uma laceração no fígado implica em sangramento ou hemorragia de grande vulto. Qual o destino deste volume de sangue que está extravasando pelo tecido do fígado?
Os problemas clínicos do Henry começaram neste momento. Devemos lembrar que o sangue, bombeado pelo coração para irrigação dos órgãos, transporta diversos nutrientes, oxigênio e substratos energéticos essenciais ao pleno funcionamento dos órgãos.
O sangramento do fígado de Henry começou a promover os primeiros sintomas debilitantes. Este volume profuso de sangue literalmente caía dentro da barriga do menino.
A barriga começa a distender progressivamente, os órgãos abdominais começam a reagir à presença daquele sangramento por meio de uma resposta inflamatória intensa, com parada dos movimentos intestinais.
Considerando que o sangue tem a função de circular somente dentro de vasos sanguíneos, num sistema considerado fechado, existem “sensores” em nosso corpo que reconhecem o extravasamento do sangue dentro de cavidades, como na barriga e no tórax.
Nesta condição, nosso coração, numa tentativa desenfreada de se adaptar e compensar as perdas sanguíneas, apresenta também algumas mudanças.
O coração de Henry, desde o momento em que o fígado começou a sangrar, certamente apresentou muitas variações da frequência cardíaca, com tendência para taquicardia e arritmias. Como consequência, deve ter sentido muito desconforto para respirar, dor ou desconforto no peito, suor frio e muito mal-estar.
Não bastasse a laceração hepática, houve lesão cerebral por algum mecanismo traumático associado. Este tipo de lesão é tão ou mais letal que a hemorragia oriunda da lesão no fígado.
Um trauma de crânio com lesão cerebral em uma criança de 4 anos implica em repercussões graves, pois as estruturas neurológicas são mais frágeis e ainda estão em desenvolvimento.
Dessa forma, o que houve foi que uma outra hemorragia começou a se instalar dentro de sua cabeça, hemorragia essa que pode tanto representar laceração no tecido cerebral como compressão do tecido cerebral pelo próprio volume de sangue em expansão.
Nosso cérebro é um órgão de tamanha complexidade e com funções tão exuberantes que não tem muita tolerância a lacerações e hemorragias. A capacidade cerebral de suportar e de se regenerar, frente a lesões traumáticas, como no caso de Henry, é extremamente limitada.
Ainda existem relatos da perícia, constatando contusões nos rins e nos pulmões. Para ficar mais claro, uma contusão consiste em um trauma direto, podendo causar hematomas nos órgãos e prejuízo na sua função.
Um hematoma nos rins pode provocar dor na região lombar, sangramento abdominal e alterações na diurese.
Um hematoma nos pulmões tem como consequências dor torácica e dificuldades significativas para respirar.
Henry, independentemente do que verdadeiramente aconteceu, não conseguiria sobreviver à dimensão e impacto de tantas lesões brutais em seus órgãos ainda muito frágeis.
Ele foi vítima de lesões traumáticas que não se restringiram aos órgãos acometidos, houve uma repercussão sistêmica e sobrecarga de seu coração.
O caso de Henry, caso seja definitivamente constatada ação violenta por parte de pessoas próximas a ele, retrata mais um caso inadmissível de violência, mais um caso de ignorância humana, mais um caso de brutalidade humana diante da fragilidade de órgãos e estruturas corporais.
O caso de Henry, dependendo das conclusões das investigações, poderá retratar que o ser humano é capaz de ferir o próprio ser humano, que o ser humano é capaz de ferir e lacerar uma criança.
Para saber mais sobre a saúde do coração, me acompanhe no Instagram: @edmoagabriel.
Prof. Dr. Edmo Atique Gabriel. Cardiologista com especialização em Cirurgia Cardiovascular, orientador de Nutrologia e Longevidade e coordenador da Faculdade de Medicina da Unilago.
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